quinta-feira, julho 31, 2008


No dia 4 de novembro, uma audiência pública no Congresso Nacional definirá, em grande parte, o fim ou não do uso de animais em circos no Brasil. Para discutir a questão estarão presentes organizações de proteção animal, por um lado, e donos de circos com animais, por outro.

Atualmente, o PL 7291/2006 está sob análise da Comissão de Educação e Cultura (CEC) da Câmara dos Deputados, que o votará em breve. O relator do projeto, deputado Antônio Carlos Biffi (PT-MS), já apresentou parecer favorável à proibição, na forma do substitutivo (pág 17 à 20). Entretanto, a pressão dos proprietários de circos pela manutenção da prática é grande e tem influenciado muitos políticos.

Abaixo Assinado pelo fim dos animais em circos - assine aqui. Os estados de SP, RJ, RS, PE e PB e várias outras cidades já têm leis que proíbem circos com animais. Uma lei federal acabará por vez com a prática em todo o país.

O apoio de toda a população através do abaixo-assinado é muito importante para aprovação do PL 7291/2006. A alma do circo é o artista!

Mais informações:

WSPA - http://www.wspabrasil.org/circo-legal.html

Animais de Circo - http://www.animaisdecirco.org/edu_flash.html (apresentação em flash)

terça-feira, julho 29, 2008

Curtas ambientais

por Jaqueline B. Ramos*

Destaque: “Nossa saúde é inseparável da saúde do mundo natural”

Às vésperas da 9ª Conferência das Partes da Convenção da Diversidade Biológica, ocorrida no final de maio na Alemanha, a IUCN (International Union for Conservation of Nature) anunciou o lançamento de um livro com informações que demonstram, de forma clara e objetiva, a ligação direta da saúde humana com a biodiversidade do planeta. “Sustentando a vida: como a saúde humana depende da biodiversidade” (‘Sustaining Life: How Human Health Depends on Biodiversity’, editado por Oxford University Press) consiste em um detalhado estudo assinado por especialistas que mostra que uma nova geração de antibióticos e novos remédios para tratamentos de doenças como a osteoporose, falência dos rins e câncer estão ameaçados caso o mundo não faça algo para reverter os crescentes números de destruição de animais e plantas nos ambientes naturais.

Aaron Bernstein é pesquisador da Escola de Medicina da Universidade de Harvard e um dos autores do livro. Ele deu esta pequena entrevista, por e-mail, para o Informativo do Instituto Ecológico Aqualung:

O livro demonstra cientificamente que muitos estudos para avanços na medicina podem ficar comprometidos devido às altas taxas de extinção de espécies registradas. Você poderia destacar as principais ameaças?
Aaron: Apresentamos sete estudos de caso com ursos, caranguejo-ferradura, anfíbios, tubarões, primatas não-humanos, plantas giminospérmicas (com sementes desprotegidas) e moluscos e todos reforçam o fato das espécies ameaçadas serem muito importantes para a medicina. No caso do gênero dos moluscos, por exemplo, dentro dos quais podemos pensar em cerca de 700 espécies que vivem nos recifes de corais, é comprovado que eles produzem provavelmente o maior número e diversidade de substâncias terapêuticas usadas em tratamentos médicos.

Considerando que o Brasil é um dos países mais ricos do mundo em termos de biodiversidade, qual seria o papel do país neste contexto?
Aaron:
Há muitas espécies brasileiras, principalmente de sapos, nas quais vários novos peptideos antimicrobianos (pequenas proteínas que têm capacidade de matar bactérias) já foram identificados, inclusive alguns que ajudaram no desenvolvimento de remédios e avanços no tratamento de hipertensão no decorrer do último século. Felizmente, nenhuma dessas espécies se encontra ameaçada, mas o rápido crescimento do número de espécies brasileiras entrando na Red List alerta para o risco de não termos chance de conhecer animais e plantas antes deles desaparecerem.

Você afirmaria que o principal objetivo do livro é alertar os Governos sobre a importância da preservação da biodiversidade para questões de saúde pública?
Aaron:
Sim, esperamos que o livro seja uma inspiração para mudanças políticas, mas também queremos ajudar todos a perceber que a nossa saúde é inseparável da saúde do mundo natural.

Origem da carne brasileira

O ex-beatle Paul McCartney tem feito um apelo, nos últimos meses, para as pessoas repensarem sua dieta em prol do meio ambiente. Mesmo não se tornando vegetarianas, ele afirma que a diminuição do consumo de carne, escolhendo dias específicos para cortá-la do cardápio, já seria de grande valia para a saúde do planeta. O argumento do músico inglês é embasado em pesquisas e dados que mostram o significativo impacto ambiental causado pela pecuária industrial, passando pela degradação de florestas para formação de pasto e pela grande quantidade de água utilizada para a criação dos animais.

Além do cenário internacional, a discussão sobre pecuária e problemas ambientais também vem ganhando manchetes de jornais no Brasil, pois o assunto está diretamente ligado à devastação da Amazônia. Visando descobrir se a carne vendida não provém de área de desmatamento ou de trabalho escravo e alertar o consumidor sobre a importância de conhecer a origem do produto comprado, o IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor divulgou, no dia do meio ambiente (05/06), o resultado obtido depois de pedir informações detalhadas sobre a origem da carne vendida nas principais redes de supermercado do país. Infelizmente as informações passadas não foram muito convincentes ou esclarecedoras, segundo o instituto.

Em geral, as respostas das empresas afirmam que existe a preocupação sobre a origem da carne, sendo relatada a inclusão de cláusulas contratuais que garantem esse compromisso por parte dos fornecedores. As empresas também afirmaram realizar um controle da efetividade dessas cláusulas, para alguns aspectos, porém não especificaram como é feita essa verificação. Apenas o Carrefour e o grupo Pão de Açúcar detalharam alguns procedimentos de rastreabilidade, mas estes ficam restritos a programas de qualidade específicos que não englobam toda a carne comercializada.

Com o objetivo de incentivar a população a cobrar dos supermercados esse controle de rastreabilidade da carne, o IDEC disponibiliza nos sites www.idec.org.br e www.climaeconsumo.org.br um cartão postal eletrônico que pode ser redirecionado para as empresas. Além disso, o instituto aconselha o consumidor a buscar outros meios para fazer esse questionamento, como pessoalmente nos supermercados ou via Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC).

Alerta sobre aumento do nível do mar

Em abril um grupo de pesquisadores britânicos e finlandeses divulgou uma descoberta que tornam ainda mais sérias as previsões sobre os impactos do aquecimento global. Uma nova análise demonstra que o nível dos oceanos pode aumentar em 1,5 metro até o final deste século. Esta previsão funciona como um alerta se comparada aos números que foram divulgados oficialmente em 2007 pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês): o aumento previsto do nível do mar era de 28 a 43 centímetros até 2100.

Um metro e meio é três vezes mais do que o sugerido pelo IPCC e poderá representar um grande impacto em países mais baixos, como Bangladesh, que tem entre 80% e 90% do seu território dentro de um metro ou mais do nível do mar "Nos últimos 2 mil anos a média global foi muito estável, variou apenas cerca de 20 centímetros", afirmou Svetlana Jevrejeva, uma das cientistas autoras do estudo, à BBC. "Mas, no final do século, prevemos que o nível do mar deve subir entre 80 centímetros e 1,5 metro. O aumento rápido nos próximos anos está associado ao derretimento rápido das camadas de gelo.”

Etanol sustentável

"Uma solução climática no mundo não passa por abandonar um combustível por outro. Todos terão de estar envolvidos.” Com esta afirmação, Yvo de Boer, secretário-executivo da Convenção da ONU para Mudanças Climáticas, ressaltou para a imprensa mundial em junho que o etanol brasileiro não gera desmatamento e é sustentável, numa comparação ao biocombustível de óleo de palma e ao etanol do milho, e que muitas das críticas ao combustível vêm da indústria do petróleo.

O representante da ONU também alertou que os países emergentes e produtores de etanol devem estar abertos a debater com o setor do petróleo sobre alternativas de tecnologias limpas. "O que precisamos é que todos se sentem à mesa para discutir. A solução para a questão climática não será a de escolher entre um ou outro combustível. O debate sobre o futuro do etanol precisa ser mais sofisticado", disse. Segundo Boer, o critério de sustentabilidade será o que determinará se o etanol poderá ou não fazer parte da solução climática no mundo de redução das emissões de gás carbônico.

Oceanos “asfixiados”

No mês em que se comemorou o Dia Mundial dos Oceanos (08/06), a WWF (World Wide Foundation) divulgou dados nada animadores sobre a saúde dos mares. De acordo com relatório concluído pela ONG internacional, cerca de 200 mil km² do fundo do mar estão praticamente mortos, número quase quatro vezes maior do que o identificado em estudo similar feito há 13 anos. As principais ameaças para os oceanos são o descarte de lixo nas águas, a pesca predatória e as mudanças climáticas. Tudo isso leva a uma “asfixia das águas”, com a diminuição drástica dos níveis de oxigênio, e a graves conseqüências ecológicas e econômicas para os povos que dependem dos oceanos.

A pesca predatória também gera um outro efeito que indica sérios desequilíbrios nos ecossistemas marinhos: a dramática proliferação de medusas nos oceanos de todo o planeta. O Instituto Oceanográfico de Paris advertiu que as medusas, criaturas marinhas sem cérebro, compostas em sua maior parte por água, foram ocupando em silêncio o vazio deixado pelo voraz apetite humano por pescado. O veneno desses invertebrados, usado para defesa, é bastante forte e mata, por ano, mais pessoas do que ataques de tubarão.

Mas o mais alarmante é que o aumento populacional das medusas tem devastado as espécies marinhas nativas dos mares. Quando atuns, tubarões e tartarugas se tornam mais raros, as medusas perdem seus predadores e, por sua vez, se alimentam de pequenos peixes e de zooplâncton através dos seus tentáculos venenosos. Por isso é difícil que os peixes voltem a habitar lugares colonizados por medusas, mesmo se a atividade pesqueira comercial for reduzida.

Não ao comércio de madeira ilegal

Os Estados Unidos deu um passo à frente no processo de combate à extração de madeira ilegal no mundo. No dia 19 de junho, o Congresso norte-americano aprovou legislação histórica que proíbe a importação de madeira ilegal, incluindo não apenas madeira em tora, mas também diversos produtos florestais, indo de móveis a papéis. Isto faz com que o país seja o primeiro no mundo a proibir comércio de madeira ilegal.

A nova legislação é uma emenda de um estatuto centenário que combate o tráfico de fauna e flora silvestre. Em 180 dias, prazo para a lei entrar em vigor, passa a ser uma violação à lei federal americana a "importação, exportação, transporte, venda, recebimento, aquisição ou compra" de qualquer planta que tiver sido "retirada, possuída, transportada ou vendida" em violação às leis estrangeiras, incluindo proibição ou autorização de exploração madeireira, medidas de proteção florestal e legislação tributária.

Os efeitos da nova lei americana serão importantes para o Brasil: os Estados Unidos são o maior importador individual de madeira amazônica, sendo responsáveis pela compra de 25% do total de madeira extraída na região."Como boa parte da madeira produzida na Amazônia é ilegal, a decisão do Congresso americano pode fechar uma parte importante do mercado para a madeira brasileira", declarou Marcelo Marquesini, coordenador do programa de madeira do Greenpeace na Amazônia.

Desperdício de água

A água desperdiçada nas capitais do Brasil daria para abastecer 38 milhões de pessoas, aproximadamente a população de países como a Argentina. A constatação é do Instituto Socioambiental (ISA), após realização de pesquisa concluída no final do ano passado. Averiguou-se que em várias cidades brasileiras os mananciais apresentam problemas de poluição e de desperdício de água nas redes de distribuição. “A gente perde por dia, antes de chegar à casa dos consumidores, uma quantidade de água muito grande”, disse Marússia Whately, coordenadora do ISA, em entrevista à Rádio Nacional.

Embora o Brasil seja um dos países com maior quantidade de água – cerca de 12% de água potável –, a distribuição no território nacional não é adequada. São Paulo, por exemplo, é uma cidade que já vive o chamado “estresse hídrico” (muita gente e pouca água). Já existe uma produção de água muito próxima do que se precisa tirar dos mananciais para consumo, mas o desperdício de água “pelo caminho” ainda é muito grande. Em São Paulo esse número chega a 30%, o equivalente ao abastecimento de 4 milhões de pessoas.

Aviação limpa

Durante a Cúpula de Aviação e Meio Ambiente, realizada em abril na Suíça, representantes dos principais nomes da indústria da aviação mundial - incluindo a brasileira Embraer - comprometeram-se a acelerar as medidas que diminuam seu impacto no meio ambiente, especialmente no que se refere ao aquecimento global. As empresas reconheceram suas "responsabilidades ambientais" e se comprometeram a fazer todo o possível para minimizar os efeitos causados pela indústria da aviação.

Organizações como a IATA (Associação Internacional de Transporte Aéreo, na sigla em inglês) expressaram a intenção de impulsionar o desenvolvimento e a aplicação de novas tecnologias, especialmente para viabilizar combustíveis mais limpos. As empresas também afirmaram estarem dispostas a otimizar a eficiência dos combustíveis de suas frotas e em melhorar a elaboração de rotas aéreas, a gestão do tráfego aéreo e as infra-estruturas aeroportuárias. Segundo dados da ONU, a aviação é responsável por 2% das emissões globais de gás carbônico e está previsto que passe a ser responsável por 3% até 2050.

Fontes: BBC Brasil, IUCN, Ambiente Brasil, Agência Envolverde, WWF e Rádio Nacional

*Publicado na edição n. 79 (maio/junho 2008) do Informativo do Instituto Ecológico Aqualung (acesse aqui).
Project R&R: Release & Restitution for Chimpanzees in U.S. Laboratories
Exemplo de construção sustentável: prédio Swiss Re Tower, em Londres, que consome 50% menos energia que edifícios de porte similar

Construção sustentável: o desafio da eficiência ambiental, social e econômica

Por Jaqueline B. Ramos*

A aplicação de conceitos de conservação ambiental e sustentabilidade deve começar dentro de casa. Mas, idealmente mesmo, deve começar na fase da construção do imóvel, seja para uso residencial ou comercial. Entre os vários argumentos para não se colocar em dúvida o porquê da Construção Sustentável, há um que se destaca: muitos não sabem, mas 50% dos gases que provocam o efeito do aquecimento da atmosfera são produzidos e emitidos por atividades da indústria de construção, superando, por exemplo, a poluição que impacta a temperatura global causada por meios de transporte.

Mas o que é Construção Sustentável? As primeiras citações do conceito foram feitas na década de 70, quando a humanidade se viu às voltas com a crise do petróleo. Mas o primeiro grande evento internacional que abordou especificamente o tema aconteceu em 1997, na cidade de Helsink, na Finlândia. Como todos os temas na área ambiental, o conceito de construção sustentável vem amadurecendo e ganhando novas prioridades desde então. De uma forma geral pode-se definir que consiste num sistema construtivo que promove alterações conscientes no entorno, de forma a atender as necessidades de edificação, habitação e uso do homem moderno, preservando o meio ambiente e os recursos naturais, garantindo qualidade de vida para as gerações atuais e futuras (conceito baseado na definição de desenvolvimento sustentável, do relatório Bruntland/ONU).

Ao longo dos anos e com a colocação das ações construtivas em prática, percebeu-se que a construção sustentável não consiste numa “receita de bolo” para resolução de problemas pontuais, mas sim numa forma de pensar a construção de forma multidisciplinar, aliando questões ambientais, sociais e econômicas e usando diferentes áreas de conhecimento para atingir os objetivos de sustentabilidade propostos.

Dentro do conceito de construção sustentável engloba-se desde o modelo mais antigo conhecido como Earthship – sistema arquitetônico de habitação autônoma criado nos anos 70 baseado no uso de resíduos como material de construção, economia e reaproveitamento de água e uso de energia alternativa e de fontes renováveis – até, por exemplo, a idéia de edificação saudável - preserva o meio ambiente e também protege seus ocupantes ou moradores da poluição dos grandes centros urbanos, não sendo uma fonte geradora de doenças, a exemplo do que é conhecido como SEE – Síndrome do Edifício Doente.

O fato é que a construção de uma casa verdadeiramente ecológica, com impactos ambientais minimizados ou eliminados ainda consiste em um desafio, conforme cita Vanderley M. John, Conselheiro e Diretor do Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS) em entrevista concedida ao Informativo do Instituto Ecológico Aqualung. Segundo Dr. John, a formação de recursos humanos que permitam colocar em prática avanços já conhecidos em termos de uso eficiente de energia e de água, uso de materiais de alto durabilidade e renováveis e busca da qualidade ambiental interna e externa, preceitos da construção sustentável, é urgente no Brasil, pois o setor tem forte tendência para se desenvolver no país. Leia abaixo a entrevista:

Entrevista: Vanderley M. John, Doutor em Engenharia Civil, Conselheiro e Diretor do Conselho Brasileiro de Construção Sustentável (CBCS)

O Conselho Brasileiro de Construção Sustentável - CBCS é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos que tem por objetivo contribuir para a promoção do desenvolvimento sustentável por meio da geração e disseminação de conhecimento e da mobilização da cadeia produtiva da construção civil, de seus clientes e consumidores. Na visão da entidade, a sustentabilidade deve contemplar as dimensões social, econômica e ambiental da cadeia produtiva da indústria da construção civil. “Estamos trabalhando na formação de redes para o desenvolvimento de novas soluções e produtos, no fomento da formação de recursos humanos e de uma cultura da construção sustentável junto ao mercado e aos consumidores”, diz Dr. John.

IEA: Quais são os principais princípios da Construção Sustentável? O conceito de construção sustentável também engloba princípios de responsabilidade social?

Dr. John: A construção sustentável engloba o 'triple botton line' - meio ambiente,social e economia. Para equilibrar os impactos ambientais e sociais com os resultados econômicos, não devemos pensar só na construção civil. O foco é o ciclo de vida do edifício, pois a maior parte dos impactos ambientais e sociaisocorrem ao longo da utilização do edifício e mesmo a demolição tem impactoimportante.

Existem problemas universais, como mudança climática, emissão de CO2,preservação da natureza etc. Mas os problemas em cada localidade são diferentes. Por exemplo, para os americanos reduzirem a emissão de CO2 , é prioritário trabalhar a questão energética. No Brasil a prioridade talvez seja a questão amazônica, que, na construção, se traduz no uso de madeiras.

A construção sustentável não tem receitas. O desafio é buscar soluções que propiciem um ambiente construído com conforto e segurança, com menor impacto ambiental e maximizando os benefícios para sociedade como um todo (não apenas usuários diretos, mas também trabalhadores, vizinhos etc). Envolve questões diversas, como trabalhar exclusivamente dentro da formalidade ou legalidade (nada de material ou serviços sem nota ou com nota suspeita, respeito a toda a legislação etc), buscar soluções tecnológicas que reduzam o impacto da construção, uso e operação, manutenção e desmobilização do edifício. Temos uma necessidade de discutir sustentabilidade em habitações para classe média e baixa e habitações sociais também. Estas são responsáveis por boa parte dos materiais de construção.

IEA: Quais são os principais materiais usados atualmente para construções sustentáveis? Estes materiais são facilmente encontrados no mercado brasileiro? Seu preço é muito mais alto do que o dos materiais tradicionais?

Dr. John: Normalmente espera-se que seja feita uma lista de materiais sustentáveis e dos não-sustentáveis. Esta divisão não é possível, com exceção de alguns materiais que representam riscos à saúde dos usuários. A sustentabilidade de um material depende de seu processo de produção (matérias-primas, eficiência energética, tipo de combustível etc), da responsabilidade social da empresa que o produz e de sua utilização.. Não é sustentável utilizar um material produzido de forma eco-eficiente e socialmente responsável em uma aplicação para a qual ele não foi desenhado ou o consumo seja, exageradamente, elevado, que resulte em baixa durabilidade, ou ainda, em uma construção que utilize mão-de-obra informal ou desrespeite a legislação urbanística.


Assim, a sustentabilidade é produto de uma combinação de seleção correta domaterial para a aplicação em questão, seleção do fornecedor, que sejaeco-eficiente e socialmente responsável, detalhamento do produto que garantadurabilidade, utilização, manutenção e disposição final adequada. Nem sempre a madeira é mais sustentável que o concreto armado, por exemplo. Se a madeira for produto de extração ilegal, não é sustentável. Por outro lado, se for produzida por manejo florestal (certificada, preferencialmente), somente será sustentável se aplicada de forma durável. Eu diria que a durabilidade é combinar os materiais, cada um em uma aplicação na qual é mais eco-eficiente, selecionar fornecedores, projetar de forma a minimizar consumo do mesmo e protegê-lo da degradação.

IEA: É mais fácil aplicar conceitos de construção sustentável em nívelresidencial ou comercial/industrial (ou vice-versa)? Por que?

Dr. John: Depende de onde o imóvel estiver localizado e da função deste. Se for imóvel residencial na cidade de São Paulo, as questões da água e distâncias de transporte são fundamentais. Em grandes cidades, a permeabilidade do solo e a presença de vegetação são também fundamentais, particularmente em áreas adensadas. Infra-estrutura para coleta seletiva é importante. A energia ésempre importante.

No meio da Amazônia, um edifício em concreto exige o transporte de materiais por longas distâncias, e isso não é sustentável. Se não for economicamente viável não é sustentável. Em cada empreendimento pode se fazer muita coisa em prol da sustentabilidade. Basta a decisão e o desenvolvimento de soluções. Naturalmente soluções avançadas, mais radicais, como incorporação de painéis fotovoltaicos e vidros extremamente sofisticados, que melhoram muito a eco-eficiência, ainda são um investimento caro, em algumas situações. Se o objetivo for fazer uma obra que seja um marco na sustentabilidade, ela não vai sair barata. Mas, embora estas obras sejam inspiradoras, elas em si não são suficientes. Precisamos mudar a construção média.

IEA: Existem normas ou processos de certificação para construções sustentáveis?

Dr. John: O que se vê hoje são os 'edifícios verdes'. Duas metodologias estrangeiras começam a ser aplicadas no mercado brasileiro: a norte-americana LEED e a francesa HQE. Várias instituições de pesquisa brasileiras, dentre elas o Instituto de Pesquisas Tecnológicas, estão discutindo metodologias próprias.

Em primeiro lugar, certificação nada mais é que uma forma de comunicação. Nomundo inteiro a quantidade de edifícios certificados é pequena, pois elessão desenhados para identificar uma elite de empreendimentos. O LEED estimater certificado 1% do mercado dos EUA, boa parte de edifícios pertencentes aórgãos públicos. Olhado do ponto de vista do número de empreendimentos, oimpacto da certificação é pequeno. Ocorre que estas certificações sãodesenhadas para destacar edifícios que adotam soluções muito avançadas, queatendam problemas prioritários para a sustentabilidade local. Diferente das certificações de qualidade, estas certificações são, por definição, não escaláveis. Algumas centenas ou milhares de edifícios certificados, por si,não vão alterar a sustentabilidade da construção brasileira, a menos que estes empreendimentos sejam indutores: inspirem novos empreendedores, criem mercados para produtos ecoeficentes e incentivem inovações tecnológicas.

Estamos no inicio do movimento, mas temos bases muito boas. Temos muitosprodutos no mercado (aquecedores solares, equipamentos para economia de água e energia, cimentos e aço mais eco-eficientes) e alguns estão entre os melhores do mundo. A certificação de madeiras avança. A qualidade melhorou bastante. Mas falta conhecimento. A formação de recursos humanos é urgente ecertamente é o nosso maior desafio.

IEA: Qual é a situação do Brasil no desenvolvimento e implementação deprojetos de construção sustentável, comparado com outros países? Que país mais se destaca atualmente?

Dr. John: Estamos naturalmente atrasados, mas estamos nos movimentando. O Brasil tem um patrimônio enorme já acumulado. Eletricidade renovável, indústrias de cimento, plástico e aço modernas e, na média, muito eco-eficientes, com produtos modernos, água etc.

Certamente a Inglaterra é o país mais avançado, pois tem uma política pública abrangente e progressiva, sofisticada. O sistema é complexo e único, e hoje tem 65 mil edifícios certificados e 200 mil em certificação. E algumas cidades já estão transformando os critérios de certificação de green buidling em regras municipais. Não tem nada igual no mundo. A Holanda também tem um sistema de políticas públicas muito avançado e, o mais interessante, não dá importância à certificação. A França tem um sistema de políticas públicas diferenciado (incluindo a certificação do impacto ambiental e da saúde dos materiais), que mais recentemente envolveu a criação de um sistema de avaliação chamado HQE.

IEA: Qual seriam as principais dicas para uma pessoa que vai construir uma casa do zero e pretende seguir os preceitos da construção sustentável – que entidades procurar, recorrer a que tipo de profissionais, quais seriam os principais fornecedores, cuidados na compra do terreno etc?

Dr. John: Economia de água, energia e segregação dos resíduos recicláveis sãofundamentais e dependem dos usuários. Energia é usar janelas, desligar a luze substituir as lâmpadas incandescentes por fluorescentes compactas. Trocara geladeira e outros equipamentos PROCEL A. E usar com sabedoria.Água é manutenção de vasos sanitários e torneiras: acabar com vazamentos e torneiras pingando. E também trocar vasos sanitários e válvulas hidras por novos de 6L. Isto é muito importante em condomínios, onde se precisa mobilizar a todos. Uma dica é acompanhar o consumo mensal destes dois insumos.

BOX: Nove princípios da Construção Sustentável

Segundo os sistemas de certificação que são referência na área de construção sustentável no mundo – BREEAM (Inglaterra), Green Star (Austrália), LEED (Estados Unidos) e HQE (França), existem nove princípios que norteiam as diretrizes de uma obra que se proponha a ser ambientalmente equilibrada. São eles:

Planejamento Sustentável da Obra
Aproveitamento passivo dos recursos naturais
Eficiência energética
Gestão e economia da água
Gestão dos resíduos na edificação
Qualidade do ar e do ambiente interior
Conforto termo-acústico
Uso racional de materiais
Uso de produtos e tecnologias ambientalmente amigáveis

Fonte: IDHEA – Instituto para o Desenvolvimento da Habitação Ecológica

BOX: Dicas de Construção e Habitação Sustentável

Uso eficiente de energia

1. Especificação de equipamentos com menor consumo e melhor eficiência possível na utilização do gás natural para todos os fins;
2. Iluminação de baixo consumo energético nas áreas comuns de uso contínuo, e iluminação “incandescente” com acionadores por sensor de presença nas áreas de uso esporádico ou intermitente. Este princípio, com maior tolerância, também é válido para as unidades privadas;
3. Planejamento do consumo energético e utilização de equipamentos para gerar energia em períodos de pico;
4. Melhor aproveitamento possível da iluminação natural, levando-se em conta a necessidade do seu controle;
5. Melhor condição de conforto térmico evitando a incidência da radiação solar direta através da adoção de soluções arquitetônicas tipo brises-soleil, venezianas, telas termo-screen externas, prateleiras de luz, vidros especiais que dispensam o uso de brises etc.;
6. Implementação e otimização de ventilação natural;
7. Adoção preferencial de acabamentos claros nas áreas de grande incidência de luz solar;
8. Tratamento das coberturas do edifício analisando a possibilidade de implementação de áreas verdes ou, caso esta solução não seja possível, utilizar pinturas reflexivas para diminuir a absorção de calor para o edifício;
9. Uso de soluções alternativas de produção de energia como a eólica ou a solar, de acordo com as condições locais. A indústria brasileira está se tornando cada vez mais forte na produção de equipamentos para estes fins, tornando viáveis estes projetos.

Uso eficiente de água

1. Captação, armazenamento e tratamento de águas pluviais para reutilização na irrigação, limpeza, refrigeração, sistema de combate a incêndio e demais usos permitidos para água não potável;
2. Utilização de bacias acopladas e válvulas especiais com o fluxo opcional por descarga, ou de sistemas a vácuo;
3. Reaproveitamento das águas de lavagem, com tratamento local, para utilização sanitária;
4. Utilização de torneiras com acionamento eletrônico ou temporizador por pressão em todas as aplicações passíveis.

Uso de materiais certificados e renováveis

1. Maximização na especificação de materiais sustentáveis objetivando o maior volume possível de utilização de materiais certificados, de manejo sustentável e recicláveis;
2. Planejamento para maior durabilidade possível nas especificações visando alta performance e evitando obsolescência prematura;
3. Utilização de materiais cujos processos de extração de matérias primas, beneficiamento, produção, armazenamento e transporte causem menor índice de danos ao meio ambiente e não estejam baseados em condições de trabalho indignas para os operários.

Qualidade ambiental interna e externa

1- Projetar utilizando técnicas que permitam uma construção mais econômica, menos poluente e que impacte de forma menos agressiva o meio ambiente;
2- Evitar ao máximo a impermeabilização do solo;
3- Evitar danos à fauna, flora, eco-sistema local e ao meio ambiente;
4- Planejar toda a obra e futura operação do edifício procurando minimizar a geração de lixo e resíduos;
5- Evitar todo e qualquer tipo de contaminação, degradação e poluição de qualquer natureza, visual, sonora, ar, luminosa etc;
6- Promover a segurança interna e externa do edifício e seus usuários;
7- Implantação e otimização de todos os recursos para a correta coleta seletiva do lixo, visando a reciclagem de materiais e a menor geração de resíduos descartáveis;
8- Evitar grandes movimentos de terra, preservando sempre que possível a conformação original do terreno;
9- Elaborar um plano eficiente de drenagem do solo para durante e após a execução das obras, evitando-se danos como erosão ou rebaixamento de lençol freático.

Fonte: ASBEA – Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura

* Publicado na edição n. 79 (maio/junho 2008) do Informativo do Instituto Ecológico Aqualung (acesse aqui).